pelos caminhos de sabará (Teatro)
Texto encomendado pela Secretaria de Cultura da
Prefeitura Municipal de Sabará-MG - 1987
beré lucas
Texto encomendado pela Secretaria de Cultura da
Prefeitura Municipal de Sabará-MG - 1987
beré lucas

1 - origem da cidade
mergulho no porão da história
pedra por pedra retiro
desentranhando do tempo
um passado sempre vivo
essa terra é minha terra
disso não abro mão
em cada pedra que piso
memória eu teço co'as mãos
e me atiro nessas águas
pra essa história contar
margeando pelos lados
pro passado encontrar
que o curso desse rio
das velhas me vai guiando
e de suas águas antigas
o passado vai brotando
pelos passos bandeirantes
trilhando nessas gerais
fincando marco na história
um certo fernão dias paes
que por parente e amigo
bandeira em se sendo de fato
percorrendo estes caminhos
com domingos borba gato
sonhou com outras estradas
atrás de esmeralda e fama
deixando com o genro
o arraial de santana
e em si sendo fundador
esse bravo bandeirante
viu crescer mais que devia
o arraial num instante
e por ato do governo
seguindo a sua trilha
o arraial de santana
breve tornou-se vila
e nossa senhora real
da conceição sabará
entre as três mais distintas
ela encontrou lugar
2 - ciclo do ouro
e pelas margens do rio
das velhas então borbulhava
ouro-sol de raio vivo
que a tudo iluminava
atraindo aventureiros
que só ouro enxergavam
fama riqueza poder
naquilo que bateavam
e nos adros das igrejas
tudo se misturava
pobres mulatos e brancos
sinhazinhas e escravos
se nos adros era uma coisa
por dentro tudo mudava
cada qual com seu andor
conforme o dinheiro mandava
na frente os "homens de bem"
mair atrás os "que possuíam"
no fundo os "que tinham pouco"
de fora os escravos ouviam
as sinhazinhas pomposas
com seus vestidos importados
desfilavam em liteiras
carregadas por escravos
e as rendas eram tantas
e tanta era a riqueza
que tanto esbanjo fazia
só crescer mais a pobreza
as roças foram desprezadas
e os quintais a fenecer
enquanto se encharcavam de ouro
não tinham o que comer
e pouco pra isso ligavam
que importa o leite e o pão
se todos estavam movidos
pelo ouro e ambição
3 - o ouro desaparece
houve um tempo já faz tempo
que esse rio caldaloso
de águas tão abastado
e de ouro tão formoso
cedeu leito pra navio
no seu dorso navegar
mas a ganância dos homens
que não encontra lugar
aos poucos foi destruíndo
para ouro encontrar
as coisas da natureza
pela guia de "enricar"
e o rio de dorso doído
corroído começou a secar
feito um velho dolorido
capenga no seu caminhar
e as águas que eram tantas
pra navio navegar
minguaram viraram filete
mal podendo ao mar chegar
4 - reavaliação histórica
esse rio é um mistério
carregando no seu dorso
que nem tal igual escravo
comem a carne deixam o osso
esse rio é um mistério
carregando no seu ombro
que nem tal igual escravo
resistindo aos escombros
de um tempo outro vivido
pela mão tão calejada
sugado de fio a fio
que nem tal a pele escrava
e deles no tempo ficou
pra gente sempre lembrar
a digital da história
que ninguém pode apagar
5 - o canto dos escravos
ó senhor proteja esse rio
das velhas já tão cansado
explorado pelos homens
que nem tal a nós escravos
ó senhor proteja a todos
mas não se esqueça dos parvos
ó senhor proteja os brancos
mas não se esqueça dos escravos
ó senhor proteja os homens
que de amor tudo se farta
mas não se esqueça senhor
do barulho da chibata
ó senhor proteja a fé
das igrejas bem construídas
mas não tivemos senhor
pro nosso teto uma viga
ó senhor tanta riqueza
de ouro dos altares-mor
constrasta com nossa pobreza
toda revestida de "ós..."
6 - os monumentos históricos
a igreja do ó
se essa jóia vale tanto
que preço pagou a pobreza
se nessa mão calo sangrou
não sangrou na da riqueza
se a idéia é de portugal
eu não nego essa raiz
e nem traço de espanhol
mas o passado contradiz
o arábe tem outra face
diferente são meus olhos
as ladainhas são tintas
mascarando o que oro
quem percebeu minha dor
na pele tão crucial
foi mestre aleijadinho
que trabalhando o metal
entre a igreja e o poder
denunciou emanando
a condição de miséria
da riqueza nos sufocando
matriz nossa senhora do carmo
traçada por tiago moreira
por aleijadinho modificada
nossa senhora do carmo
é matriz mais que encantada
se erguendo da terra
esculpida pelas mãos
estrutura-se essa matriz
toda em pedra sabão
e entre contrastes se mescla
o artista dividido
branco-claro azul-celeste
e o ouro do homem moído
essa cabeça pequena
sobre os ombros sustentando
é deus e o diabo no corpo
nas veias do anjo jorrando
e quem entra nessa matriz
reparte o seu coração
pela direita são joão da cruz
pela esquerda são simão
matriz de nossa senhora conceição
fachada sem ornatos
por dentro toda dourada
a matriz de nossa senhora
da conceição se instala
e em tamanho natural
nossa senhora padroeira
vinda de portugal
aos fiéis ela norteia
e no teto se avista
o percurso da rainha
com seus passos encantados
no destino ladainha
igreja são francisco de assis
despojada de riqueza
essa igreja de assis
destoa dos dois balcões
que ao santo contradiz
esse santo é sem riqueza
da riqueza se apartou
viveu sempre na miséria
pra riqueza não ligou
modesta que o santo é modesto
teto ingênuo e popular
sua nave é sem adornos
mas dá gosto de espiar
o cristo este "senhor morto"
que anda a circular
pelas ruas da cidade
para os homens lembrar
o sacrifício do ofício
quando de fé se está
o espiríto embuído
a gente deve lutar
igreja nossa senhora das mercês
e a mão escrava
escalavrando no tempo
misturando suor e pedra
promove mais este evento
e a irmandade dos negros
deixando o gesto fazer
erguem mais esta igreja
da nossa senhora mercês
museu do ouro
quanta memória guardada
quanta vida já vivida
registra essa casa:
passos do homem na vida
de cada peça encostada
parece o passado brotar
sangue vivo de outros tempos
a gente sente pulsar
quanto amor mordendo dentro
nesses peitos devem estar
quanto suor de escravo
que a história não pode apagar
há um calor estranho
circulando por esta casa
barulho de mãos fazendo
ressuscitar os fantasmas
e a gente de repente
sente o passado tão perto
feito água do "kaquende"
jorrando em céu aberto
e parece que foi ontem
sinto os passos borbulhar
pelas botas bandeirantes
pra essa vila fundar
vejo ouro na bateia
reluzindo de brilhar
sinhazinhas e escravos
andando por todo lugar
sabará rompe com o tempo
é eterno no seu estar
e por mais que o tempo gire
sabará há de ficar
e em cada pedra que piso
eu sinto o passado voltar
em cada dobra de esquina
vozes me vêm falar
que um tempo outro vivido
não se apaga do olhar
pr'aqueles que espiam fundo
sabará há de ficar
eternamente!
mergulho no porão da história
pedra por pedra retiro
desentranhando do tempo
um passado sempre vivo
essa terra é minha terra
disso não abro mão
em cada pedra que piso
memória eu teço co'as mãos
e me atiro nessas águas
pra essa história contar
margeando pelos lados
pro passado encontrar
que o curso desse rio
das velhas me vai guiando
e de suas águas antigas
o passado vai brotando
pelos passos bandeirantes
trilhando nessas gerais
fincando marco na história
um certo fernão dias paes
que por parente e amigo
bandeira em se sendo de fato
percorrendo estes caminhos
com domingos borba gato
sonhou com outras estradas
atrás de esmeralda e fama
deixando com o genro
o arraial de santana
e em si sendo fundador
esse bravo bandeirante
viu crescer mais que devia
o arraial num instante
e por ato do governo
seguindo a sua trilha
o arraial de santana
breve tornou-se vila
e nossa senhora real
da conceição sabará
entre as três mais distintas
ela encontrou lugar
2 - ciclo do ouro
e pelas margens do rio
das velhas então borbulhava
ouro-sol de raio vivo
que a tudo iluminava
atraindo aventureiros
que só ouro enxergavam
fama riqueza poder
naquilo que bateavam
e nos adros das igrejas
tudo se misturava
pobres mulatos e brancos
sinhazinhas e escravos
se nos adros era uma coisa
por dentro tudo mudava
cada qual com seu andor
conforme o dinheiro mandava
na frente os "homens de bem"
mair atrás os "que possuíam"
no fundo os "que tinham pouco"
de fora os escravos ouviam
as sinhazinhas pomposas
com seus vestidos importados
desfilavam em liteiras
carregadas por escravos
e as rendas eram tantas
e tanta era a riqueza
que tanto esbanjo fazia
só crescer mais a pobreza
as roças foram desprezadas
e os quintais a fenecer
enquanto se encharcavam de ouro
não tinham o que comer
e pouco pra isso ligavam
que importa o leite e o pão
se todos estavam movidos
pelo ouro e ambição
3 - o ouro desaparece
houve um tempo já faz tempo
que esse rio caldaloso
de águas tão abastado
e de ouro tão formoso
cedeu leito pra navio
no seu dorso navegar
mas a ganância dos homens
que não encontra lugar
aos poucos foi destruíndo
para ouro encontrar
as coisas da natureza
pela guia de "enricar"
e o rio de dorso doído
corroído começou a secar
feito um velho dolorido
capenga no seu caminhar
e as águas que eram tantas
pra navio navegar
minguaram viraram filete
mal podendo ao mar chegar
4 - reavaliação histórica
esse rio é um mistério
carregando no seu dorso
que nem tal igual escravo
comem a carne deixam o osso
esse rio é um mistério
carregando no seu ombro
que nem tal igual escravo
resistindo aos escombros
de um tempo outro vivido
pela mão tão calejada
sugado de fio a fio
que nem tal a pele escrava
e deles no tempo ficou
pra gente sempre lembrar
a digital da história
que ninguém pode apagar
5 - o canto dos escravos
ó senhor proteja esse rio
das velhas já tão cansado
explorado pelos homens
que nem tal a nós escravos
ó senhor proteja a todos
mas não se esqueça dos parvos
ó senhor proteja os brancos
mas não se esqueça dos escravos
ó senhor proteja os homens
que de amor tudo se farta
mas não se esqueça senhor
do barulho da chibata
ó senhor proteja a fé
das igrejas bem construídas
mas não tivemos senhor
pro nosso teto uma viga
ó senhor tanta riqueza
de ouro dos altares-mor
constrasta com nossa pobreza
toda revestida de "ós..."
6 - os monumentos históricos
a igreja do ó
se essa jóia vale tanto
que preço pagou a pobreza
se nessa mão calo sangrou
não sangrou na da riqueza
se a idéia é de portugal
eu não nego essa raiz
e nem traço de espanhol
mas o passado contradiz
o arábe tem outra face
diferente são meus olhos
as ladainhas são tintas
mascarando o que oro
quem percebeu minha dor
na pele tão crucial
foi mestre aleijadinho
que trabalhando o metal
entre a igreja e o poder
denunciou emanando
a condição de miséria
da riqueza nos sufocando
matriz nossa senhora do carmo
traçada por tiago moreira
por aleijadinho modificada
nossa senhora do carmo
é matriz mais que encantada
se erguendo da terra
esculpida pelas mãos
estrutura-se essa matriz
toda em pedra sabão
e entre contrastes se mescla
o artista dividido
branco-claro azul-celeste
e o ouro do homem moído
essa cabeça pequena
sobre os ombros sustentando
é deus e o diabo no corpo
nas veias do anjo jorrando
e quem entra nessa matriz
reparte o seu coração
pela direita são joão da cruz
pela esquerda são simão
matriz de nossa senhora conceição
fachada sem ornatos
por dentro toda dourada
a matriz de nossa senhora
da conceição se instala
e em tamanho natural
nossa senhora padroeira
vinda de portugal
aos fiéis ela norteia
e no teto se avista
o percurso da rainha
com seus passos encantados
no destino ladainha
igreja são francisco de assis
despojada de riqueza
essa igreja de assis
destoa dos dois balcões
que ao santo contradiz
esse santo é sem riqueza
da riqueza se apartou
viveu sempre na miséria
pra riqueza não ligou
modesta que o santo é modesto
teto ingênuo e popular
sua nave é sem adornos
mas dá gosto de espiar
o cristo este "senhor morto"
que anda a circular
pelas ruas da cidade
para os homens lembrar
o sacrifício do ofício
quando de fé se está
o espiríto embuído
a gente deve lutar
igreja nossa senhora das mercês
e a mão escrava
escalavrando no tempo
misturando suor e pedra
promove mais este evento
e a irmandade dos negros
deixando o gesto fazer
erguem mais esta igreja
da nossa senhora mercês
museu do ouro
quanta memória guardada
quanta vida já vivida
registra essa casa:
passos do homem na vida
de cada peça encostada
parece o passado brotar
sangue vivo de outros tempos
a gente sente pulsar
quanto amor mordendo dentro
nesses peitos devem estar
quanto suor de escravo
que a história não pode apagar
há um calor estranho
circulando por esta casa
barulho de mãos fazendo
ressuscitar os fantasmas
e a gente de repente
sente o passado tão perto
feito água do "kaquende"
jorrando em céu aberto
e parece que foi ontem
sinto os passos borbulhar
pelas botas bandeirantes
pra essa vila fundar
vejo ouro na bateia
reluzindo de brilhar
sinhazinhas e escravos
andando por todo lugar
sabará rompe com o tempo
é eterno no seu estar
e por mais que o tempo gire
sabará há de ficar
e em cada pedra que piso
eu sinto o passado voltar
em cada dobra de esquina
vozes me vêm falar
que um tempo outro vivido
não se apaga do olhar
pr'aqueles que espiam fundo
sabará há de ficar
eternamente!
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